Hoje, quando um empreendedor precisa buscar investimentos, ainda existe a cultura do “nós contra eles”. Mas isso é péssimo, tanto para o investido quanto para o investidor. Precisamos jogar juntos pelo negócio e pelo país.

Imagine um jovem empreendedor brasileiro que tenha uma ideia inovadora. Primeiro, ele vai atrás da família, dos amigos, e depois de bancos, em busca de recursos para colocar a empresa de pé. Sozinho, sem muito aconselhamento, vai tentando, arduamente, vencer as dificuldades de validar e colocar seu projeto para rodar, quando se dá conta de que o dinheiro não será o bastante. A situação do caixa é desesperadora, ele não tem recursos para pagar seus três ou quatro funcionários, está com uma dívida enorme, em meio aos juros proibitivos do nosso país.

Só então é que ele vai atrás de investimento. O problema é que, nessa situação difícil, o investidor, mesmo sendo um anjo, pode querer uma porcentagem grande do negócio. O que significa que, logo no começo de sua caminhada, o empreendedor poderá ter sua participação diluída demais. O anjo fica com uma parcela que julga justa pelo risco que está correndo, depois mais para frente, um fundo de Venture Capital tira mais uma boa parcela do bolo. Qual será a motivação do criador da ideia para continuar investindo tempo, suor e lágrimas no crescimento do negócio se ele deixar de ter controle do negócio que ele criou?

Infelizmente, o quadro não é incomum. A indústria de venture capital às vezes é agressiva demais na relação risco/retorno com os empreendedores — o que, dependendo do tamanho do negócio, pode gerar desmotivação e frustração por parte deles, do “outro lado da mesa”. O que boa parte dos investidores não enxerga é que com isso todos perdem.

ALIÁS, EIS AÍ UMA NOÇÃO QUE JÁ TEMOS QUE MUDAR: A DE QUE EXISTEM DOIS LADOS DA MESA NESSA HISTÓRIA.

Investidores e empreendedores precisam trabalhar juntos, lado a lado, para criar valor. Ambos precisam se desarmar e buscar a confiança mútua e o fair-play, ingredientes sem os quais é melhor não ter jogo. E agora, a partir da minha experiência nessa relação com empreendedores, quero refletir sobre alguns pontos que considero fundamentais no acesso ao capital.

O empreendedor pode (e deve) captar mais cedo

A questão com os empreendedores jovens chama mais a atenção. A meu ver, o desafio deles de captar é muito mais difícil. Eles enfrentam mais dificuldades porque geralmente acreditam que podem fazer tudo sozinhos, contando somente com a ajuda da família e amigos, com pouca experiência e conhecimento para tocar um negócio.

Além do aspecto financeiro e da dificuldade de estruturação do negócio, o empreendedor tem que acessar gente que pensa diferente e que vão testar a sua ideia exaustivamente.

Recomendo que o empreendedor esteja aberto a receber apoio. Com isso, tem chance de errar menos.

AMIGO DA FACULDADE, FAMÍLIA; TODO MUNDO PENSA IGUAL. MAS ELE PRECISA DE ALGUÉM QUE O TIRE DA ZONA DE CONFORTO.

Assim, vejo que o nosso trabalho é ajudar esse empreendedor desde o começo, sugerindo caminhos, direções e controles para que ele não se endivide desnecessariamente e consiga se estruturar melhor, aumentando a possibilidade de sucesso no seu empreendimento.

Tem também os empreendedores mais experientes. Quem já empreendeu costuma querer ajudar, seja pela criação de networking ou mesmo por um investimento-anjo. Quem já empreendeu está disposto a assumir mais risco, e o jovem empreendedor pode aproveitar isso.

A disputa tem que ser na bola, e não na canela

Outro ponto que considero fundamental é que o capital tem que ser amigável. Nas conversas com empreendedores, devemos procurar ser justos, alinhar interesses, propósitos e objetivos. É algo que vai além do valuation. Deixar de estar em “lados diferentes”.

Claro que não são conversas muito fáceis. Há regras rígidas a serem seguidas e o retorno financeiro é sempre um objetivo, mas deve ser priorizado o retorno para a sociedade.

Nesse sentido, acredito que falte, hoje, capital amigável. E por amigável me refiro à ideia de criar valor juntos. E isso passa por uma mudança na lógica de valuation: muda-se de quanto a empresa vale hoje, que pode ser irrelevante, para o quanto de valor pode ser criado em conjunto.

No Kviv Ventures, queremos nos posicionar como um fundo de capital amigável. E isso não significa que não queiramos resultados. Significa que pode fazer sentido, em vez de espremer no valuation agora, ganhar um desconto sobre a série A, quando for realizada no futuro, por exemplo.

Explico-me: imagine que vou negociar com você o valor da empresa, por exemplo, R$ 1.

O QUE É MELHOR? FICAR COM 20% DE R$ 1 OU SE DEDICAR A TRANSFORMAR R$ 1 EM R$ 3, E TER 30% DE DESCONTO NUMA PRÓXIMA CAPTAÇÃO?

Pode até custar mais caro o investimento, porém o interesse com o empreendedor fica alinhado e se compartilha riqueza.

A importância de se pensar em longo prazo

Outro ponto muito importante é que Venture Capital não é renda fixa. Quase todo mundo costuma comparar o custo de oportunidade da renda fixa com investimento em startup, que possui risco e retorno muito diferentes. Uma pergunta que ouço bastante é: “A renda fixa me rendeu 12% ano passado; e o fundo de venture capital, vai render quanto?”.

Isso revela uma visão de curto prazo e uma alta aversão a risco. Porque o verdadeiro retorno de um VC vem no longo prazo. Perde-se no começo para eventualmente ganhar lá na frente, retornos muitos superiores a uma renda fixa, mas as pessoas ainda estão muito presas ao momento.

Buscamos pessoas, não ideias

Outro aprendizado que adquiri com o tempo é o de que os cenários mudam, mas pessoas, na maioria das vezes não. Empreendedores costumam ser apaixonados por suas ideias, inebriados por elas — mas as condições de mercado e as premissas podem mudar muito rapidamente. Isso pode exigir mudanças na ideia, no plano e no modelo de negócios.

Aí, a chance de desencontro é altíssima: o investidor enxergando uma coisa, o empreendedor procurando por outra… tem tudo para dar errado. Volta-se a estar em lados opostos. É por isso que costumamos olhar mais para o dono (a pessoa) das ideias e menos para as próprias ideias.

Por que apoiar jovens empreendedores e suas ideias?

Até agora, falei sobre os problemas que costumam resultar da inexperiência dos jovens empreendedores. Pode até parecer que não queremos apoiá-los, mas é o exato oposto: fiz essas reflexões para ajudá-los a se preparar melhor para captar investimentos, num momento tão importante de seus negócios.

POR QUE NÓS — E ME REFIRO AO PAÍS — PRECISAMOS DESSA “INGENUIDADE” DOS JOVENS, QUE OLHAM SEMPRE O COPO MEIO CHEIO? É ESSA INGENUIDADE QUE VAI, AOS POUCOS, COBRIR A IMENSA LACUNA DE DEMANDAS DO BRASIL.

Acredito que esses empreendedores vão conseguir fazer a diferença; são eles que farão o negócio funcionar. E, com um número maior de empresas se formando e contratando 50, 100 pessoas cada, formaremos uma sociedade mais produtiva e forte.

O propósito do capital de risco

Quero concluir com uma breve reflexão sobre algo de que os jovens empreendedores precisam entender bem: propósito. Tê-lo bem claro certamente vai atrair contatos e oportunidades que ajudarão a construir sua trajetória.

Meu avô, Samuel Klein, por exemplo, mal sabia ler e escrever. Mas muita gente o ajudou a empreender, principalmente os clientes. Porque ele tinha um propósito alinhado com seus “fregueses”, que o fazia seguir firme no negócio.

Nós também temos o nosso — que é ajudar o país a empreender, a ser mais inovador, mais competitivo. É confortável estar na renda fixa, mas só o capital de risco vai ajudar o país a voltar a ser uma terra de oportunidades — a mesma que acolheu meu avô depois dele passar por campos de concentração.

E acreditar na força do capital de risco significa, claro, acreditar na força dos empreendedores. É por isso que sempre fez parte de nossa filosofia investir neles. E acredito que o caminho é esse!

Autor: Raphael Klein

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